Diamantes feitos em laboratório se popularizam com preços mais baixos

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A Terra leva mais de 1 bilhão de anos para forjar um diamante. O chinês Feng Canjun faz o mesmo em uma semana.

Em Zhengzhou, na província chinesa de Henan, a fábrica Jiaruifu, de propriedade de Feng, abriga 600 máquinas que simulam as condições geológicas da Terra. Elas produzem diamantes de três quilates em apenas sete dias. Feng afirma fabricar cerca de 100 mil quilates por mês. A China responde por mais de 70% dos diamantes sintéticos usados em joalheria no mundo.

Esse crescimento coincidiu com a queda na demanda global por diamantes naturais, derrubando os preços —especialmente os de menor quilate, que atingiram os níveis mais baixos da década. Empresas como De Beers, Alrosa, Rio Tinto e Petra Diamonds viram suas receitas despencarem. Em 2023, a receita da De Beers foi a metade da registrada no ano anterior.

Embora a tecnologia para produzir diamantes exista desde os anos 1950, só recentemente tornou-se financeiramente viável para aplicação em joias. Hoje, um diamante sintético de três quilates custa apenas 7% do valor de um natural equivalente, segundo o analista Paul Zimnisky.

Nos EUA, os sintéticos já representam 17% do mercado de varejo em volume —ante 3% em 2020— e mais da metade das alianças de noivado, segundo a consultoria Tenoris e a plataforma The Knot. Com isso, analistas consideram que o setor tradicional enfrenta um processo de "canibalização permanente".

A China iniciou sua produção de diamantes sintéticos por motivos estratégicos nos anos 1960, após a ruptura com a União Soviética, e consolidou sua indústria nos anos 1980, em Henan. Inicialmente voltada para uso industrial, a produção migrou para o setor joalheiro na última década.

A maior parte das pedras chinesas é produzida por meio de alta pressão e temperatura, mas cresce o uso da deposição química em vapor, que permite criar gemas maiores camada por camada. Após a lapidação, feita principalmente em Surat, na Índia, as pedras seguem para centros comerciais como Antuérpia e Dubai antes de chegarem ao varejo.

Apesar do papel central da China na cadeia, muitos consumidores desconhecem sua origem, já que os rótulos geralmente indicam o país de lapidação como origem da pedra. O setor também tem implicações estratégicas: empresas ligadas à defesa chinesa produzem diamantes para aplicações tecnológicas, como lasers, óptica e semicondutores.

O domínio chinês se deve à combinação de tecnologia própria e eletricidade barata, com subsídios que reduziram em até 50% o custo energético das fábricas. Os equipamentos usados no país, proibidos para exportação por serem de uso dual (civil e militar), custam menos que os internacionais.

Em resposta à ascensão dos sintéticos, a De Beers criou, em 2018, a Lightbox, sua própria marca de diamantes cultivados. A estratégia de segmentar o mercado não impediu uma guerra de preços, agravada pela queda nos casamentos durante a pandemia. No fim de 2024, a empresa acumulava US$ 2 bilhões (R$ 11 bilhões) em estoque não vendido. A Lightbox encerrou as operações este ano.

Entre 2020 e 2024, o preço de varejo de um diamante sintético de três quilates caiu de US$ 28,9 mil (R$ 161 mil) para US$ 3.900 (R$ 21,7 mil). O quilate bruto produzido por Feng pode ser vendido por até US$ 15 (R$ 83). Diante disso, o governo de Henan criou uma associação para regular o setor e impôs um preço mínimo por quilate.

O setor tradicional tenta reagir com campanhas publicitárias. A De Beers e a Signet lançaram a "Worth the Wait", e países produtores se comprometeram a destinar 1% das vendas para promover diamantes naturais. A Natural Diamond Council também chegou a rotular os sintéticos como "falsificações", mas recuou após críticas.

Folha Mercado

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Além da concorrência, o setor enfrenta a desaceleração do consumo na China pós-Covid e um descompasso entre oferta e demanda. Mesmo com a queda na produção minerada, a retração do mercado foi maior.

A popularização dos sintéticos democratizou o acesso aos diamantes. Em Zhengzhou, mulheres jovens e aposentadas compram anéis para si mesmas em vez de esperar por presentes em noivados. Tendência semelhante ocorre fora da China. A joalheria online Angara, por exemplo, passou a oferecer diamantes de laboratório há 18 meses e espera que 80% das alianças de noivado nos EUA usem pedras sintéticas em cinco anos.

No mercado chinês, os diamantes naturais perderam espaço quase por completo. Muitas lojas fecharam ou migraram para os sintéticos. Já o ouro, tradicional entre noivos chineses e com preço em alta, tornou-se o componente mais caro dos anéis, superando as pedras.

Feng, por sua vez, investe em diamantes personalizados a partir de cabelo humano ou cinzas cremadas, com demanda crescente na Coreia do Sul e em Israel. Os clientes enviam amostras de famílias ou casais para serem transformadas em pedras únicas —uma nova fronteira na personalização do luxo.

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