Em vez de reclamar da vida, pratique esportes

4 dias atrás 6

"Está muito calor aqui dentro", disse uma inglesa para a filha adolescente ao sentar-se perto de mim no ônibus em uma tarde de verão em Londres.

Foram 30 minutos de viagem com a mãe reclamando. "Que absurdo não ter ar-condicionado"; "por que o trânsito a esta hora?" (não tinha engarrafamento); "a família do seu pai não presta".

Ao fim de um longo inverno, em uma cidade incrível, com um transporte público extremamente eficiente, lá estava ela reclamando da vida e do calor de 25 graus.

A filha, tranquila, tentava acalmar a fera. Não só por ser emocionalmente mais madura, mas imagino que por instinto. É insuportável conviver com quem está sempre insatisfeito.

Não que seja proibido externar frustrações. O mundo está cheio de situações e pessoas que tiram a gente do sério. Seria mais agradável se o ônibus fosse climatizado. Mas, talvez por ser de um país onde o transporte público é, em geral, ruim, eu nunca criticaria os ônibus pontuais e silenciosos de Londres. Tenho feito um exercício interno, inclusive, para reclamar cada vez menos.

O excesso de conforto é uma doença da vida moderna. Ficamos dependentes de casas e carros com ar-condicionado, comida entregue na nossa porta, escada rolante, elevador, streaming. Se algo não sai exatamente como gostaríamos, ficamos insatisfeitos, colocando nossa felicidade nas mãos do outro. Se formos esperar que tudo esteja sempre como gostaríamos, viveremos frustrados.

Acredito que uma maneira bem eficiente de diminuir essa dependência e relativizar minha visão do mundo é através do esporte –os que pratico e aos que assisto.

O exercício físico é uma forma intencional de passar por desconforto. Ao ar livre, mais ainda. Tem que encarar calor, frio, sol, chuva, vento, neve. Resistir é pior.

Atletas também são minha inspiração. Resiliência acima da reclamação. Há disciplina, esforço nos treinos, sei de quanto abrem mão por uma medalha, por uma conquista, ou por melhorar a cada dia.

Certa vez, um repórter perguntou à surfista Stephanie Gilmore se ela não ficava cansada de viajar tanto de avião para competir. A australiana respondeu, sorrindo: "Se me leva para onde quero ir, está tudo certo". Desde que vi a entrevista, penso de maneira igual. Se um avião me leva com segurança aonde quero chegar, como vou reclamar?

Na quinta-feira (17), dia seguinte à cena do ônibus, soube com tristeza da morte do austríaco Felix Baumgartner em um acidente de parapente na Itália. Em 2012, o paraquedista se tornou a primeira pessoa a saltar da estratosfera, quebrando a barreira do som em queda livre. Fiquei tão impressionada que entrevistá-lo virou quase obsessão.

No ano seguinte, Baumgartner saltou de base jump do Cristo Redentor. Finalmente o conheci, e fizemos uma reportagem para o SporTV. Fiquei encantada em vê-lo falar, de forma tranquila, sobre tudo o que passou para conseguir o feito. Nada parecia um fardo, pelo contrário.

No domingo (19), farei uma meia maratona. Por várias razões, não me preparei como gostaria, vai estar mais calor do que esperava. Fosse há alguns anos, eu me irritaria se cruzasse a linha de chegada em um tempo acima do planejado. Desta vez, prometi para mim mesma que o importante é terminar. Vou ficar satisfeita independentemente do que o relógio apontar. E sem reclamar.

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