Na Europa, o modo habitual da discussão sobre o próprio projeto europeu é ciclotímico, feito de ciclos alternados entre o pessimismo exagerado e, por vezes, uma ligeira euforia. As notícias de que um acordo foi fechado entre a União Europeia e os Estados Unidos seguiram esse padrão.
Nas primeiras horas, proclamou-se que o acordo —que inclui tarifas de 15% para as exportações europeias e de zero para as americanas, além de promessas de investimento direto europeu em energia e armamento— era uma humilhação para a Europa, uma prova de vassalagem aos interesses de Trump e de irremediável miopia por parte das elites de Bruxelas.
Passadas umas quantas horas, veio um outro olhar sobre os pormenores do acordo, salientando que a tarifa de 15% é um imposto sobre o consumo que os próprios americanos vão ter de pagar, ao passo que os consumidores europeus evitam por agora o aumento de preços; e que, de qualquer forma, as promessas de investimento direto são vagas ou impossíveis de implementar.
Mais umas horas se passaram e começaram a surgir notícias de que a Comissão Europeia e a Casa Branca têm entendimentos diferentes sobre o acordo que tinham acabado de celebrar, o que sugere que a opção europeia tenha sido por dar uma vitória política de primeira hora a Trump, escolhendo evitar sofrimento no curto prazo para a economia europeia e apostando no prolongamento de negociações em que os especialistas comerciais europeus são peritos.
Quero defender aqui que nenhum desses modos de análise é o correto. O acordo entre a UE e os EUA é, no meu entendimento, mau. Mas por nenhuma das razões que tenho visto pulularem nas análises imediatas, mais emocionais.
A ideia de que a estratégia europeia é guiada pela burrice ou pela covardia não tem base empírica nem verificação histórica. Fazer negociações comerciais está, desde sempre, no centro da especialidade das instituições que estiveram na fundação da União Europeia.
A cabeça desses funcionários não é regida por critérios "quentes" de orgulho, vitórias e derrotas, mas antes critérios frios e cerebrais. As negociações são fastidiosas e podem demorar décadas até acabar —o Mercosul que o diga. O que aconteceu em Washington não parece típico, porque não é.
A escolha principal não é aparecer nas primeiras páginas como derrotado ou vitorioso, mas antes prolongar o envolvimento com os EUA ou escolher uma via de corte e autonomia estratégica.
Lá Fora
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É aqui que eu discordo da estratégia da Comissão Europeia, e dos Estados-membros com interesses comerciais mais fortes como a Alemanha, que preferem evitar o sofrimento econômico de curto prazo em nome de uma estabilidade ilusória em tempos de Trump, mas comprometendo as suas metas climáticas ou diminuindo o incentivo para prosseguir uma política industrial forte.
No meu entendimento, sendo a incerteza inevitável, a Europa deveria optar por escolher a sua própria autonomia estratégica, afastando-se do caos trumpista. Essa continua a ser a prioridade das prioridades, e o acordo desta semana não a impede, mas também não passa a mensagem correta para os agentes econômicos europeus nem para o resto do mundo.