Lula e Supremo dobram aposta contra Trump

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A ingerência do presidente Donald Trump na política brasileira atingiu um paradoxal paroxismo nesta sexta (18), com a determinação de medidas cautelares contra seu aliado Jair Bolsonaro (PL), agora obrigado a usar tornozeleira eletrônica, a passar as noites em casa e a largar as redes sociais.

Apenas quando Michel Temer foi preso por quatro dias em 2019 um ex-presidente brasileiro foi submetido a tal escrutínio judicial. Diferentemente do que ocorreu naquela ocasião, o caso contra Bolsonaro é sólido e sua condenação no julgamento da trama golpista, certo.

Entra em cena Trump, ironicamente o maior ídolo do bolsonarismo e responsável por adiantar a punição ao ex-mandatário. A tática da família Bolsonaro de incitar o americano contra o Brasil de forma geral é um dos maiores erros políticos dos últimos anos, dada a comoção nacionalista que o ataque do tarifaço despertou.

O erro no atacado agora se repete no varejo, com o Supremo Tribunal Federal reagindo ao que viu como tentativa de fuga em planejamento pelo ex-presidente aos EUA. Nem seria inédito: Bolsonaro abandonou o cargo pouco antes do fim do mandato para ir à Flórida, convenientemente longe da posse de Lula e do 8 de Janeiro.

Ali, ele nem estava inelegível, nem era réu por tentativa de golpe. Noves fora discussões inevitáveis que advirão sobre os méritos jurídicos da decisão de Alexandre de Moraes, ela se funde ao caldo político do momento de forma inexorável.

Isso contamina de saída o debate, como tudo na polarização brasileira. Bolsonaristas celebrarão um mártir e dirão que Moraes prova a "caça às bruxas" denunciada em duas postagens e uma carta pública de Trump ao aliado, tornando indistinguíveis avaliações da Justiça e motivações políticas —para, nessa visão, favorecer Lula.

Essa leitura ignora que a escalada dos fatos foi disparada quando Eduardo Bolsonaro tornou-se embaixador da anistia do pai nos EUA. Parece que deu certo, só que não da forma como o ausente deputado pretendia.

Primeiro, porque o rito rígido de Moraes tem vida própria, independente do que deseja Lula, ele mesmo um crítico do que chamava de caça às bruxas quando foi alvo da Operação Lava Jato.

Segundo, e mais importante, porque o ataque frontal de Trump ao Brasil bagunçou de vez o coreto da direita brasileira, que vive o impasse de orbitar o capital eleitoral de Bolsonaro e ter de lidar com sua toxicidade crescente.

A reação do principal candidato a tomar o lugar do líder inelegível em 2026, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), foi exemplar disso: foi de defensor de Bolsonaro a alvo de bolsonaristas, para agora ensaiar uma acomodação com todos os lados. O leite, contudo, já estava respingado sobre sua imagem.

Do ponto de vista de Lula, o perigo está no tamanho que a crise está tomando. O pronunciamento feito na quinta (17) acerca da crise, após um dia passado em cima de palanques exercitando o melhor do antiamericanismo que o DNA petista lhe confere, sugere os ônus e os bônus da tática.

Por um lado, o presidente colou nos adversários o epíteto de traidores da pátria, algo que tem validade garantida até 2026. Por outro, dobrou a aposta contra a intervenção de Trump, o que pode até a eleição lhe tirar fôlego, caso as medidas ensaiadas pelos EUA virem política punitiva efetiva com efeitos práticos na economia.

Com Moraes fazendo o mesmo ante a possibilidade de a ofensiva do americano tirar do Brasil seu réu mais vistoso, está configurado um cenário inédito de importância de um presidente americano na vida política local.

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