Imerso em água, uma estrutura majoritariamente branca e dividida em dois eixos que lembram pernas se mexe diante da presença de pequenas hastes. O movimento é giratório: em alguns momentos, a estrutura vai para a esquerda, em outros, para a direita. Em ambos os casos, o objeto mantém seu eixo central.
O artefato é um robô produzido a partir de matéria orgânica: um tecido muscular proveniente de esqueleto. O processo de construir esse pequeno robô e os resultados obtidos com testes foram publicados em um artigo na revista científica Matter, no ano passado.
Shoji Takeuchi, um dos autores do estudo e professor da escola de pós-graduação em ciência da informação e tecnologia da Universidade de Tokyo, no Japão, afirma que o uso de materiais biológicos em robôs permite o alcance de resultados dificilmente atingidos somente com elementos sintéticos.
"Na robótica, a integração desses materiais possibilita funções como movimento adaptativo, interação suave com ambientes e estratégias de controle de inspiração biológica. Essa sinergia aprimora a funcionalidade do robô além do que é possível com componentes puramente artificiais", afirma o professor da universidade japonesa.
Takeuchi e seus colegas não são os únicos cientistas que se valem de materiais orgânicos para desenvolver robôs mais eficazes e inteligentes. Em 2022, por exemplo, pesquisadores publicaram um artigo relatando o uso de pernas de aranha para a construção de pinças robóticas. Outro artigo publicado no mesmo ano foi sobre um robô que simula um peixe. A máquina contou com células-tronco humanas e estruturas cardíacas de camundongos para desenvolver um movimento que se assemelha ao animal aquático.
No caso da pesquisa de Takeuchi, o objetivo foi desenvolver um robô com movimentos de rotação mais delicados e precisos. Equipamentos projetados anteriormente já haviam sido bem-sucedidos em missões como andar em linha reta ou em realizar grandes rotações. No entanto, robôs apresentavam dificuldades para girar de forma suave, como quando um ser humano rotaciona seu corpo na mesma posição em que se encontra.
Para superar essa barreira no campo robótico, tecido muscular esquelético mostrou-se valioso para Takeuchi. O pesquisador explica que esse tipo de matéria orgânica pode ser controlada por meio de estimulações elétricas, o que aumenta a precisão do movimento que se busca realizar.
"Ao contrário do músculo cardíaco, que se contrai espontaneamente, o músculo esquelético pode ser ativado seletivamente, permitindo movimentos programáveis", completa Takeuchi.
Para funcionar adequadamente, o tecido precisou ser acoplado primeiramente ao colágeno ou a estrutura de peles artificiais, algo já utilizado em trabalhos anteriores. Então, ele precisava ser preservado em meios de cultura, que são sistemas artificiais que fornecem nutrientes e outras substâncias necessárias para a conservação de matérias orgânicas.
Os resultados do estudo de Takeuchi foram positivos. O robô projetado a partir do tecido muscular apresentou avanços comparados a outros modelos anteriores. "O robô demonstrou com sucesso movimentos de avanço e parada e giros precisos em comparação com robôs bio híbridos convencionais", escreveram os cientistas no artigo.
Para Takeuchi, a construção desse robô foi um passo importante para futuras aplicações dessa tecnologia. Ele aponta que a tecnologia pode permitir um aprofundamento em entender como funcionam os mecanismos naturais de locomoção humana. Além disso, os aprendizados da pesquisa podem resultar na construção de robôs com capacidades mais precisas em andar em locais cheios de obstáculos complexos, já que as máquinas poderiam executar movimentos mais suaves e próximos daqueles vistos em humanos.
O autor do estudo também diz acreditar que melhorias poderiam ser feitas na tecnologia desenvolvida por ele e por seus colegas. Uma das possibilidades seria utilizar diferentes camadas de pele natural para proteger o tecido muscular no robô. Em casos assim, o equipamento não precisaria estar imerso em meios de cultura, aumentando sua aplicação e durabilidade.