'Mexicoke', a Coca-Cola com açúcar de cana defendida por Trump, é bebida importada e 'cool' nos EUA

23 horas atrás 3

No quinto episódio da temporada deste ano da série "And Just Like That", spin-off de "Sex and The City", a personagem Carrie, de Sarah Jessica Parker, se aborrece com a amiga Miranda, vivida por Cynthia Nixon, a quem hospedava.

"Esta era a minha última Coca-Cola mexicana?", questiona a protagonista, segurando uma garrafa de vidro do refrigerante também conhecido entre modernos e hispânicos que vivem nos Estados Unidos pelo apelido de "mexicoke".

O refrigerante produzido no México leva açúcar de cana na composição, enquanto o produzido nos Estados Unidos é feito com xarope de milho com alto teor de frutose desde o fim dos anos 1980, decisão tomada para baratear o produto.

Outros países, como o Brasil e Portugal, também usam açúcar de cana. Segundo a Coca-Cola, o tipo de produto usado para adoçar suas bebidas varia de um país para outro.

Oficialmente, a importação de Coca-Cola mexicana começou em 2005, principalmente para o estado fronteiriço do Texas. Antes disso, segundo registros do The New York Times, americanos atravessavam a fronteira para comprar o refrigerante.

Mesmo com a formalização da importação, a forte presença da bebida em mercados voltados ao público hispânico ajudou a elevar o produto ao status de "cool e descolado". Em 2014, o New York Times notava que entre os que se orgulhavam de ser "early adopters" [os que chegam às tendências antes delas se popularizarem], a "'mexicoke' era o novo preto".

A decisão da gigante de bebidas de incluir em seu portfólio nos Estados Unidos também o refrigerante produzido com açúcar de cana foi um aceno ao presidente Donald Trump e aos consumidores que pagam mais caro pela bebida importada –na Amazon, 24 garrafinhas de 355 ml da "mexicoke" custam US$ 35,99, enquanto 24 garrafas de meio litro do produto americano custam US$ 13,99.

Há alguns dias, Trump havia escrito em seu perfil na rede Truth Social que a empresa de bebidas mudaria a composição do refrigerante a seu pedido. Na publicação, ele comemora e diz que "é simplesmente melhor", mensagem lida como um indicativo de que ele preferia a versão que usa o açúcar de cana como adoçante.

Trump, contudo, é conhecido por gostar muito de outro produto da Coca-Cola, a Coca Diet, que não leva açúcar e é adoçada artificialmente com aspartame. Em seus comentários sobre a decisão da fabricante, Trump não diz por quais motivos considera o uso do açúcar de cana uma boa decisão.

A Casa Branca foi procurada para comentar o assunto, mas não respondeu. Segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), desde meados dos anos 2000, a cana responde por 40% a 45% da produção local de açúcar. O restante vem da beterraba.

Os preços de açúcar no mercado americano têm estado acima do que os negociados mundialmente, principalmente, segundo a USDA, pelas políticas domésticas e de tarifas. Conforme o órgão oficial, o número de fazendas de cana-de-açúcar e de açúcar de beterraba vem caindo nos últimos 20 anos.

Nos Estados Unidos, o plantio de cana está concentrado no Texas, na Louisiana e na Florida, este último o estado natal de Trump e o maior produtor local. O país não é, contudo, autossuficiente em açúcar de cana, e precisa recorrer à importação.

A administração Trump tem expressado preocupação com o uso do xarope de milho de alto teor de frutose. O secretário de Saúde Robert F. Kennedy Jr. já citou o ingrediente mais de uma vez e o relacionou a questões como diabetes e obesidade.

Cristina Souza, CEO da Gouvêa Foodservice, diz que, para o consumidor, a substituição de um açúcar por outro é de "ganho zero" no aspecto nutricional, pois ambos são açúcares simples, de rápida absorção. "O xarope de milho é um pouco pior, mas a diferença é tão justa que quase não existe", diz.

Em relação ao risco de desenvolvimento de diabetes ou obesidade, os dois produtos estão na mesma prateleira. "Normalmente, esse tipo de coisa não é nem noticiada, pois as indústrias estão sempre avaliando meio de entregar um produto viável financeiramente e mais aderente ao que o consumidor quer."

Na terça-feira (22), James Quincey, CEO e chairman da Coca-Cola, disse durante teleconferência dos resultados do último trimestre que a empresa está sempre explorando maneiras de atender aos consumidores e que produzir o refrigerante com açúcar de cana reflete o interesse por "experiências diferenciadas".

Na indústria de processamento de milho, a aversão ao xarope com alto teor de frutose estimulada pela gestão Trump foi indigesta.

John Bode, presidente da Associação de Refinadores de Milho, disse que a substituição é sem sentido e pode causar a eliminação de milhares de empregos no setor, queda na receita de fazendeiros e estimular a importação de açúcar estrangeiro. "Tudo isso sem qualquer ganho nutricional."

Read Entire Article