Um dos principais aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro e seu ex-secretário especial de Assuntos Fundiários, Nabhan Garcia defende que o capitão reformado se mantenha em silêncio sobre a sobretaxa de 50% anunciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Em contato praticamente diário com Bolsonaro, Nabhan preside a União Democrática Ruralista (UDR Nacional), uma instituição que representa os produtores pecuaristas. O assunto das tarifas já foi tema de conversa com o ex-presidente.
"A pecuária brasileira está na expectativa de ver o que acontece, mas não acho justo querer jogar isso aí em cima do Bolsonaro. Essa questão tarifária não tem nada a ver com ele, mas ele sabe que, se falar qualquer coisa, vai apanhar. Então, acho que ele deve ficar neutro", disse Nabhan à Folha.
O presidente americano não apenas cita o nome de Jair Bolsonaro em sua carta aberta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como atribui, sem provas, a sua decisão de sobretaxar os produtos do país a supostas perseguições políticas do Executivo e do Judiciário.
Base do bolsonarismo, o agronegócio tem reagido com estupefação em relação ao anúncio de Donald Trump e cobra cautela e negociação, na expectativa de que o cenário retroceda. Dentro do clã Bolsonaro, o momento é de alerta, por receio de que essa crise tenha desdobramentos graves e recaia sobre seu colo.
"Todo mundo sabe que 100% dos pecuaristas, dos produtores, são Bolsonaro. Então, eles não aceitam essa acusação de dizer que o Bolsonaro é culpado disso. Isso é uma questão geopolítica, e é resultado de uma postura que o governo brasileiro também vem adotando, de apoiar ditaduras, ditadores, países que não são realmente democráticos."
Ao excluir Bolsonaro e sua família de qualquer tipo de influência sobre a decisão de Donald Trump, Nabhan Garcia também critica a posição dos frigoríficos brasileiros, um elo da cadeia do agro que ele define como "oligopólio".
"A verdade é que hoje existe um clima muito ruim entre o produtor do agro e a indústria. Por quê? Porque eles nunca repassam para nós o que eles estão ganhando. O produtor está sempre ali, numa margem pequena. Talvez essa situação sirva para fazer um alerta, parece uma praga, um castigo para a indústria frigorífica, que nunca compartilhou a lucratividade."
Apesar de o setor do agro estar completamente pressionado, Nabhan evita fazer críticas a Donald Trump, a quem se refere como alguém de "personalidade forte".
"É o presidente do país mais poderoso do planeta. Você vai confrontar? Eu acho que o melhor é dialogar. É hora de ter humildade, rever o que está acontecendo. Se quiser bater de frente, vai ser pior para todo mundo. Acontece que, hoje, o diálogo do Brasil com os Estados Unidos é zero", afirma.
O exportadores de carne afirmam quem, se a sobretaxa for mantida, fica inviável seguir com a exportação da proteína para os EUA. A alíquota de 50% faria preço médio da carne exportada saltar de US$ 5.732 por tonelada para cerca de US$ 8.600.
Os Estados Unidos são o segundo maior comprador de carne bovina do Brasil, só atrás da China. Atualmente, respondem por cerca de 14% da receita total brasileira de carne bovina. No primeiro semestre deste ano, as vendas para os EUA tiveram um aumento relevante, com a receita e o volume exportado mais que dobrando em relação ao mesmo período de 2024.
O volume total exportado até junho foi de 181.477 toneladas, uma alta de 112% sobre o resultado verificado no primeiro semestre do ano passado e que corresponde a cerca de um terço de todo o volume exportado pelo Brasil em 2024 para o mundo.
A receita total de exportações de carne bovina do Brasil para os EUA no período foi de US$ 1,04 bilhão, 102% acima do alcançado entre janeiro e junho de 2024, conforme dados oficiais da Abiec (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes).
A FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) também reagiu com preocupação sobre o assunto. Por meio de nota, afirmou que a medida "representa um alerta ao equilíbrio das relações comerciais e políticas entre os dois países".
"A nova alíquota produz reflexos diretos e atinge o agronegócio nacional, com impactos no câmbio, no consequente aumento do custo de insumos importados e na competitividade das exportações brasileiras", declarou a frente da bancada ruralista.
Produtores brasileiros de suco de laranja também estão atônitos com o anúncio de uma sobretaxa de 50% sobre a exportação brasileira. O Brasil é hoje o maior produtor e exportador de suco de laranja do planeta, vendendo 95% de sua produção para o Exterior. Desse volume, 42% tem os Estados Unidos como destino.
O setor cafeeiro nacional diz que vê com preocupação a medida anunciada nesta quarta-feira (9) pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Em nota divulgada na tarde desta quinta-feira (10), a Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café) afirma que a decisão de Trump foi comunicada de forma unilateral e representa "um grave retrocesso nas relações comerciais entre os dois países que pode gerar impactos extremamente negativos e relevantes para toda a cadeia produtiva do café brasileiro".
O Brasil é o principal fornecedor de café aos EUA e os americanos são os principais importadores do produto brasileiro. Entre janeiro e maio de 2025, os Estados Unidos compraram 2,87 milhões de sacas do Brasil, o equivalente a 17,1% de todo o volume exportado pelo país. "Nós temos a esperança de que o bom senso prevaleça a previsibilidade de mercado", disse Marcos Matos, diretor-geral do Cecafé (Conselho dos Produtores de Café do Brasil).