O mercado financeiro brasileiro é, há décadas, um jogo de rouba-monte, na visão dos bancos, corretoras e gestoras de fundos. Uma pilha relativamente pequena de clientes endinheirados é disputada a unhas e dentes, por serem os bons geradores de receita para as empresas. Ainda que passemos por uma popularização das finanças, o trabalho dos players do mercado continua focado em t irar o cliente do vizinho.
Mas essa dinâmica pode estar prestes a mudar. O Global Wealth Report 2025, relatório do gigante UBS sobre a riqueza do mundo, aponta para uma mudança estrutural e inevitável: nos próximos 25 anos, as fortunas do mundo inteiro mudarão de mãos de uma maneira inédita. E isso pode redefinir o jogo no Brasil.
Não é um espalhamento da riqueza, nem um movimento social. O Brasil ainda ostenta o maior Índice de Gini de riqueza entre os 56 países analisados pelo UBS. Isso significa que nossa desigualdade é, infelizmente, campeã mundial.
O acontecimento será demográfico: os donos do dinheiro de hoje estão com idade avançada e, nos próximos 25, haverá uma transferência de patrimônio entre seus herdeiros, de uma magnitude nunca vista. Só no Brasil, essa mudança geracional está estimada em algo perto de US$ 9 trilhões, é o segundo na lista, atrás apenas dos Estados Unidos.
Isso diminui a concentração financeira nas mãos de um grupo etário ainda criado na época das agências bancárias físicas, relacionamento via cafezinho com o gerente e, tradicionalmente, menor apetite ao risco.
Folha Mercado
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A geração que deve assumir o controle do dinheiro já tem mais confiança em ambientes virtuais, foi criada em uma economia mais globalizada e com traquejo tecnológico muito maior do que seus pais e mães. Com isso, mandar dinheiro para um banco ou outro, uma corretora ou outra, dentro ou fora do Brasil, tem um peso muito menor na tomada de decisão. Deixar um pouco em cada plataforma também não parece mais algo tão problemático.
Conversando com o Daniel Haddad, CIO (Chief Investment Officer) da Avenue, corretora especializada em levar investimentos de brasileiros para os EUA, vi como estão se preparando para essa mudança, criando uma esteira diferente para os próximos 25 anos. Talvez o mais importante seja entender que os futuros grandes clientes estão abertos a novos tipos de relacionamento com o mercado financeiro. É um público que não quer mais ser "capturado", mas atendido. E não precisará mais migrar tudo o que tem na conta para um único banco ou corretora.
Investidores que, segundo o relatório do UBS, começaram com imóveis e agora querem ações e ativos internacionais, devem ocupar um espaço que hoje está desorganizado e, muitas vezes, desatendido por grandes bancos e assessorias tradicionais.
A Avenue chama isso de "diáspora patrimonial brasileira". Eu prefiro chamar de janela de oportunidade para um mercado melhor. Um ciclo novo de clientes, com outra cabeça, outro bolso e outras expectativas. Se os players tradicionais continuarem apenas tentando roubar cartas uns dos outros, vão perder o verdadeiro jogo: aquele que está começando agora.