Projeto aposta em fungos e árvores que brilham para mostrar biodiversidade da mata atlântica

22 horas atrás 3

Existem 132 espécies de fungos bioluminescentes —que produzem e emitem luz própria— no mundo. No Brasil, estão 28 delas. E, dessas, 12, em forma de cogumelos, podem ser encontrados na Reserva Ambiental Betary, no Vale do Ribeira, segundo o IPBio (Instituto de Pesquisas da Biodiversidade), organização sem fins lucrativos que mantém o local.

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A área de 60 hectares de mata atlântica preservada concentra também liquens e sapos fluorescentes —que brilham a partir da luz negra—, além de larvas de vaga-lumes que cintilam em um lago durante a noite.

O conjunto, que compõe uma floresta brilhante e atrai turistas, é usado pelo IPBio para divulgar a biodiversidade da mata atlântica e incentivar sua conservação. Segundo dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), restam apenas 12,5% da vegetação original do bioma.

"Quem mora na cidade de São Paulo não tem ideia do que é a mata atlântica e do potencial que nós temos", diz o biólogo Isaías Santos, um dos cinco pesquisadores fixos na reserva.

"Você vê a quantidade de espécies que ainda estamos descobrindo, então imagina o quanto perdemos em biodiversidade lá atrás."

Santos, que trabalha no IPBio desde 2007, assina a pesquisa sobre a primeira larva de mosquito que produz e emite luz azul encontrada na América do Sul, publicada no Scientific Reports, da Nature, em 2019. Ele também é autor de um artigo sobre a descoberta de uma nova linhagem de cogumelo bioluminescente, a menor do mundo, publicada na revista Journal of Fungi, em 2023.

Ele encontrou o primeiro cogumelo bioluminescente na região com Henrique Domingos, também biólogo do IPBio, após muitas horas de observação à noite em Iporanga, cidade com cerca de 4.000 habitantes onde fica a reserva. Os pesquisadores haviam sido avisados pelo professor Cassius Stevani, da Universidade de São Paulo, da possível existência dos fungos brilhantes na região —o clima úmido da floresta e sua preservação favorecem o aparecimento deles.

Em suas expedições noturnas, conta Domingos, os pesquisadores passaram a levar lanternas de luz ultravioleta para procurar liquens fluorescentes (conjunto de fungos e algas).

Ao apontar os feixes de luz para os caules das árvores, onde se alojam os liquens, viram manchas que brilhavam com diferentes tons de amarelo, azul, vermelho e laranja.

Os cientistas afirmam que o fenômeno não deve ser exclusivo da Reserva Betary ou do Vale do Ribeira. Segundo eles, a principal especificidade da reserva é a total disponibilidade dos biólogos para a observação da natureza.

A partir da categorização da biodiversidade na região, diz Silva, além de conhecer melhor um bioma importante para o país, os pesquisadores podem descobrir o potencial de uso das diferentes espécies em fármacos, assim como incentivar o turismo local —segunda maior fonte de renda dos moradores de Iporanga, atrás apenas da agricultura.

"É possível ver monitores ambientais trabalhando esse mesmo conteúdo [da bioluminescência] dentro do parque Petar [Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira]. Outros moradores locais estão trabalhando dentro das suas propriedades, mostrando isso para turistas", afirma o biólogo, que ressalta a necessidade de preservar a vegetação para que essa forma de trabalho seja mantida.

Segundo Sérgio Pompéia, fundador da Reserva Betary, do IPBio e da consultoria ambiental CPEA, a atração pelos cogumelos brilhantes, lagos de vaga-lumes ou liquens que deixam as árvores fluorescentes serve para aumentar o interesse das pessoas pelo bioma e, consequentemente, pela sua preservação.

"Você vê o bicho se comportando, a luz brilhando, o cogumelo crescendo, e fala: ‘Que beleza, que interessante’. E naturalmente você vai proteger isso. Então, o objetivo final é a preservação da vida e da biodiversidade. O caminho é fazer pesquisa para conhecer melhor e divulgar", afirma.

O IPBio está construindo mais uma reserva, dessa vez na amazônia, em Alter do Chão (PA), e pretende ter uma em cada bioma do país.

Diante das mudanças climáticas, a categorização do bioma se torna ainda mais importante. "Como nasci aqui, sei o regime hidrológico que temos. Tem lugares dos rios em que eu não vi pedras durante minha infância inteira, mas onde hoje estão expostas. Ou seja, o volume das nossas águas está diminuindo", diz Silva.

Chuvas torrenciais, que causam alagamentos no centro urbano, também têm ocorrido com maior frequência e intensidade, afirmam os pesquisadores e moradores. Em dezembro, uma tempestade derrubou a ponte que liga a Reserva Betary à cidade, bem como o deque construído para facilitar os banhos no rio Betary.

A reportagem viajou a convite do IPBio.

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