O tarifaço estabelecido pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a produtos brasileiros gerou aumento de tensões com a chance de prisão preventiva de Jair Bolsonaro (PL), em contexto marcado por promessa de dobra de apostas pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e a convicção de que Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), faria o mesmo.
Em entrevista a um podcast na segunda-feira (21), o parlamentar falou que a escalada do magistrado que levou, na sexta-feira (18), a medidas cautelares contra seu pai era esperada, haja vista a tendência do ministro de "dobrar a aposta". Ele indicou estar disposto a aumentar sua ofensiva no exterior e fez uma analogia sobre "queimar a floresta inteira" para cumprir o objetivo de se livrar do ministro.
A sucessão de eventos mais recentes que culminou na possibilidade de prisão de Jair Bolsonaro se intensificou com a taxação de Trump, no dia 9, sobre produtos brasileiros. O episódio foi seguido pela determinação de medidas cautelares contra o ex-presidente, na última sexta, quando Jair Bolsonaro teve que colocar tornozeleira eletrônica e ficou proibido de usar as redes sociais. No mesmo dia, os EUA proibiram Moraes e outros magistrados do STF de entrarem no país.
Na segunda-feira (21), Moraes assinou despacho no qual afirmou que a medida sobre as redes sociais "inclui, obviamente, as transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas em qualquer das plataformas das redes sociais de terceiros". Ainda na segunda, intimou o ex-presidente a elucidar possível descumprimento da cautelar após episódio em que Jair Bolsonaro falou com jornalistas. Nesta terça-feira (22), a defesa do político negou o descumprimento da ordem.
Segundo Eduardo, a escalada das ações era prevista e foi informada a integrantes da Casa Branca. "Quando a gente senta aqui para conversar com as autoridades americanas, a gente até avisa, fala: ‘Olha, ele [Moraes] provavelmente vai dobrar a aposta'. Isso já está precificado no nosso projeto. É por isso que está caminhando de uma maneira maestral tudo que nós imaginamos", afirmou.
O ex-comentarista da Jovem Pan Paulo Figueiredo, que é réu na ação sobre a trama golpista julgada no STF, reforçou no podcast a percepção do parlamentar.
"O plano [da ofensiva no exterior por uma anistia] sempre foi, desde o início, baseado em duas premissas básicas. Premissa número um: o Alexandre de Moraes sempre vai dobrar a aposta. Então, não há surpresa nesse momento. [...] Então, eu posso dizer a você que até agora o plano está funcionando perfeitamente, inclusive as suas consequências. Era sabido que o Alexandre de Moraes iria reagir. Era sabido [...] que ele ia fazer o presidente Bolsonaro de refém", afirmou.
Os aliados indicaram que a estratégia é também intensificar as ações. Os dois usaram na entrevista uma analogia sobre, se necessário, "queimar a floresta inteira para conseguir se livrar do Alexandre de Moraes". Questionado sobre se a "floresta" seria o povo brasileiro, Paulo Figueiredo afirmou se tratar do establishment. Eles também disseram que mais sanções estão por vir.
A intensificação da postura contra Moraes também se deu entre congressistas bolsonaristas em Brasília. Depois do despacho que mostrou a extensão da proibição a Bolsonaro de falar nas redes sociais, parlamentares defenderam o impeachment do ministro como prioridade. Eles disseram, ainda, que vão intensificar as manifestações nas ruas.
Enquanto aliados estimulam o confronto, Jair Bolsonaro chegou a cancelar entrevista ao portal Metrópoles na segunda, diante do receio de que o ato fosse interpretado como descumprimento das restrições impostas por Moraes. O político, entretanto, mostrou no mesmo dia à imprensa sua tornozeleira, ação que havia recusado a jornalistas na sexta, e fez um breve pronunciamento público.
"Não desviei recurso, não matei ninguém, não trafiquei ninguém. Isso aí [tornozeleira] é covardia o que estão fazendo com um ex-presidente da República. Isso aqui é um símbolo da máxima humilhação", disse na ocasião.
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Segundo Ricardo Yamin e Maira Scavuzzi, doutores em direito pela PUC-SP, uma possível prisão de Bolsonaro é válida se houver o entendimento pela Justiça de que a cautelar foi descumprida.
Yamin avalia que Moraes não tem agido para "dobrar a aposta", como sugere Eduardo. "O que está fazendo é não se curvar a uma pressão externa", afirma.
Já Maira Scavuzzi avalia haver uma "queda de braço" entre a família Bolsonaro e a Justiça. Ela considera que a tensão provocada por Eduardo e Jair pode ter como objetivo usufruir do clima de "perseguidos políticos".
"Eles [a família Bolsonaro] estão em uma queda de braço com o STF. Isso de dobrar a aposta de um lado ou de outro nada mais é do que um embate de forças", diz. "Se eles afirmam que já contavam com as medidas cautelares, isso aumenta a minha avaliação de que Bolsonaro pretende capitalizar politicamente em cima da provável prisão para vestir, de novo, a fantasia de perseguido político."