Para a maioria dos países que receberam cartas do presidente Donald Trump na semana passada ameaçando tarifas elevadas —especialmente as nações asiáticas com economias voltadas para o fornecimento de produtos aos Estados Unidos— não há substitutos óbvios como destino para suas mercadorias. Mas estão fazendo o possível para encontrá-los.
Líderes empresariais e políticos em todo o mundo ficaram amplamente perplexos com a imposição de novas tarifas pela Casa Branca, mesmo enquanto governos enviavam representantes a Washington com ofertas de novas compras e promessas de reformas. Trump está erguendo novas barreiras comerciais e exigindo concessões profundas até 1º de agosto, alegando anos de prejuízo pelo fato de os EUA comprarem mais do que vendem.
"Em todo o mundo, ferramentas antes usadas para gerar crescimento agora são empregadas para pressionar, isolar e conter," disse Anwar Ibrahim, primeiro-ministro da Malásia, em uma reunião de líderes do Sudeste Asiático na quarta-feira. "À medida que enfrentamos pressões externas, precisamos fortalecer nossas bases. Comercializar entre nós. Investir mais uns nos outros."
Já há alguns sinais desses esforços. O novo presidente da Coreia do Sul, Lee Jae Myung, enviou emissários especiais à Austrália e à Alemanha para discutir questões de defesa e comércio, e planeja despachar delegações para vários outros países. Brasil e Índia anunciaram planos de aumentar seu comércio bilateral em 70%, para US$ 20 bilhões.
A Indonésia afirma estar perto de firmar um tratado com a União Europeia que eliminaria a maioria das tarifas entre as partes. E no Vietnã, que segundo Trump aceitou tarifas de 20% sobre seus produtos destinados aos EUA antes das cartas da semana passada, a vice-ministra do Comércio destacou os esforços para reduzir a dependência dos consumidores americanos, aproveitando outros acordos comerciais.
Folha Mercado
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"À medida que mais países percebem que é mais difícil satisfazer as exigências dos EUA, o interesse em cooperar com outros parceiros vai se intensificar," disse Wendy Cutler, vice-presidente do Asia Society Policy Institute.
Há muitos precedentes de países buscando novos parceiros quando antigas alianças se deterioram.
Durante o primeiro mandato de Trump, a China retaliou às tarifas americanas reduzindo as compras de soja dos EUA. O Brasil preencheu essa lacuna e agora supre a maior parte da demanda chinesa por soja, deixando os agricultores americanos com excedente e poucos compradores.
Em 2017, a China boicotou produtos sul-coreanos em retaliação à decisão do país de sediar um sistema antimísseis dos EUA, prejudicando seriamente os setores de consumo e turismo da Coreia do Sul, dependentes da China. Como resposta, os sul-coreanos ampliaram o comércio e os investimentos com Indonésia, Malásia e Vietnã.
Como as nações asiáticas já vinham tentando diversificar suas bases de clientes, a atual movimentação não é totalmente nova. Mas a região ainda está longe de uma integração perfeita. A Coreia do Sul, por exemplo, tem resistido a se juntar ao Acordo Abrangente e Progressivo para a Parceria Transpacífica (CPTPP), um pacto comercial que surgiu após o fracasso das negociações com os EUA em 2016.
Byung-il Choi, economista sul-coreano e ex-negociador comercial, tem pressionado para que seu país ingresse no acordo, que o Japão já assinou. A nova hostilidade de Washington pode tornar isso possível, e o presidente Lee tem demonstrado mais disposição de cooperação com o Japão do que muitos esperavam durante sua campanha.
"Japão e Coreia acreditavam ser aliados firmes dos EUA, mas Donald Trump não acredita em alianças," disse Choi. "Então o Japão está ansioso por membros mais significativos, e o novo governo coreano está dizendo: ‘Em nome do interesse nacional, podemos fazer qualquer coisa.’"
A nova rodada de tarifas surge justamente quando a China também está inundando o mundo com produtos baratos para sustentar seu crescimento baseado em exportações. Esse excesso de carros, eletrodomésticos, eletrônicos e têxteis dificulta para os vizinhos da China encontrarem seus próprios nichos.
Alguns desses países podem se beneficiar da determinação do governo Trump em evitar que produtos chineses entrem nos EUA por meio de terceiros. Empresas chinesas já vêm instalando fábricas no Sudeste Asiático em busca de mão de obra mais barata, e os novos acordos podem incentivá-las a transferir mais partes de suas cadeias de suprimentos para fora da China. Empresas na região, pressionadas pela concorrência chinesa e agora pelas tarifas, podem buscar mais produtividade para manter participação de mercado.
"Podem melhorar a eficiência, talvez investindo em novas tecnologias, digitalizando suas fábricas, para reduzir custos," disse Dionisius Narjoko, economista sênior do Instituto de Pesquisa Econômica para ASEAN e Leste Asiático. "Isso pode baratear as exportações e torná-las mais competitivas em novos mercados ou até mesmo nos EUA."
No fim das contas, pode ser vantajoso para os países que se tornaram alvo das tarifas de Trump formularem uma resposta mais coletiva. Até agora, isso não aconteceu, já que os líderes mundiais continuam tentando garantir tratamentos mais favoráveis para seus próprios países. Mesmo a crescente aliança dos Brics —que atraiu a ira de Trump ao se reunir no Rio de Janeiro e admitir oficialmente a Indonésia como membro— evitou tomar qualquer atitude para resistir às tarifas dos EUA.
"Não vi indicações de que as nações do Sudeste Asiático estejam tentando se unir e apresentar uma frente comum," disse Alexander Hynd, professor assistente do Instituto Asiático da Universidade de Melbourne. Mas isso pode mudar se o atual ritmo de instabilidade continuar.
"Os EUA estão tentando desmontar rapidamente o sistema que eles mesmos criaram, o que tem surpreendido muita gente," afirmou Hynd.