A cúpula do Congresso planeja aprovar um calendário que obrigará o governo Lula (PT) a executar as emendas parlamentares ao Orçamento antes da eleição de 2026.
O objetivo é potencializar o uso desses recursos bilionários nas campanhas dos atuais deputados e senadores, seja para reeleição ou para concorrer a outros cargos, de acordo informações colhidas pela reportagem com três pessoas envolvidas no tema.
O movimento ocorre após o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), romper um acordo com o PT e não entregar ao partido a relatoria do projeto da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2026, que estabelece as balizas para a execução das despesas do ano seguinte.
No lugar, Motta escolheu o deputado Gervásio Maia (PSB-PB). Ele ofereceu como prêmio de consolação ao PT a relatoria da medida provisória de aumento dos impostos sobre bets, fintechs e investimentos hoje isentos de Imposto de Renda.
Embora seja um fiel aliado do presidente Lula, Gervásio Maia é também muito amigo do presidente da Câmara e foi escolhido com a missão de elaborar o calendário para pagamento de emendas.
O deputado do PSB foi procurado, mas não respondeu até a publicação desta reportagem. Motta não quis comentar.
O governo ainda não foi avisado sobre a proposta, mas interlocutores do presidente dizem confiar que Maia fará algo combinado com o Palácio do Planalto, já que é um aliado. O Executivo até estaria disposto a discutir um cronograma que considere o período eleitoral, mas não quer que isso conste na lei.
Em 2023, o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE) foi o relator da LDO e inventou o calendário das emendas. Lula vetou, e o Congresso concordou sob a condição de que o governo respeitaria o cronograma, mas as decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) por mais transparência bloquearam a execução das verbas no segundo semestre.
A visão do governo, de acordo esse interlocutor, é de que estabelecer o calendário em lei engessará o Executivo, que fica sem margem de manobra em caso de frustração de receitas, e ainda prejudica politicamente o presidente, ao obrigar que essas verbas tenham prioridade no fluxo de pagamentos em detrimento dos investimentos dos ministérios.
Integrantes do centrão dizem que o calendário é uma alternativa para evitar que o governo só dê andamento às emendas após o período eleitoral e, com isso, diminua a influência das verbas na eleição. O dinheiro é direcionado para prefeitos e governadores em troca de apoio e também com a expectativa de que as obras resultantes dos repasses rendam votos.
Além disso, é uma forma do centrão impedir que o governo priorize seus aliados antes da eleição e deixe para o fim do ano a liberação das verbas de quem apoiar outras candidaturas presidenciais contra Lula —o que quase todos os partidos de centro e centro-direita já anunciaram que vão fazer no próximo ano.
Dois parlamentares disseram à Folha que a proposta de calendário ainda não está pronta, mas já foi encomendada aos técnicos que trabalham no parecer do projeto. Há duas alternativas em elaboração, que serão levadas a Hugo Motta na próxima semana.
O objetivo principal é que as emendas individuais e de bancada sejam empenhadas ainda no primeiro semestre, para evitar as vedações do período eleitoral. O empenho é a primeira fase da execução orçamentária e se refere à reserva de recursos para pagar uma despesa.
Além disso, a ideia é obrigar que o governo pague até setembro as transferências especiais para prefeituras e governos estaduais, conhecidas popularmente como "emendas Pix". A eleição de deputados e senadores ocorrerá em 4 de outubro de 2026, junto com o primeiro turno da disputa para governador e presidente.
A obrigatoriedade envolveria apenas as emendas parlamentares de execução obrigatória (as individuais e as de bancadas regionais). No caso das emendas de comissão, o entendimento é de que não será possível determinar um cronograma de pagamento porque elas não são impositivas, ou seja, o governo pode escolher se as executará ou não.
Brasília Hoje
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O Congresso diz que o calendário evitará a demora que ocorreu este ano, quando a liberação das emendas só começou no fim de maio.
A Secretaria de Relações Institucionais do governo Lula tem afirmado que isso só ocorreu pelo atraso do Congresso em votar o Orçamento, o que aconteceu só em março, e que a execução está mais rápida do que nos anos anteriores, se considerado o prazo após a sanção.
A votação da LDO deste ano também está atrasada e, novamente, a lei não será aprovada a tempo do recesso parlamentar, na segunda quinzena de julho, em desacordo com o que determina a Constituição.
Neste caso, a demora é responsabilidade tanto do governo quanto do Congresso. O Palácio do Planalto pediu ao relator que aguarde a divulgação do relatório bimestral de receitas e despesas, em 21 de julho, antes de votar a LDO. A solicitação ocorreu para que o cenário sobre as contas do próximo ano esteja mais claro.
Gervásio Maia deve apresentar o parecer preliminar à proposta na próxima semana. O plano é que a CMO (Comissão Mista de Orçamento) vote esse documento logo em seguida, o que abre prazo para os deputados e senadores apresentarem sugestões ao texto.