Mais de 8 em cada 10 brasileiros consideram que os chefes de órgãos públicos são importantes para determinar a qualidade dos serviços públicos e, além disso, confiariam mais no Estado se soubessem que esses líderes passaram por processos de seleção, aponta pesquisa do Datafolha encomendada pelo Movimento Pessoas à Frente.
Para 84% dos brasileiros, os líderes são os principais responsáveis pela qualidade dos serviços públicos, e 89% dos entrevistados afirmaram que confiariam mais no governo e em órgãos públicos se as chefias do funcionalismo tivessem processos melhores de seleção.
As entrevistas foram feitas de forma presencial, com questionário estruturado entre os dias 9 e 12 de junho. Foram ouvidas 2.008 pessoas, em cidades de diferentes portes de todas as regiões do Brasil.
A pesquisa foi feita para que o Movimento Pessoas à Frente pudesse embasar sua proposta de regras para a seleção e nomeação de pessoas para cargos comissionados –ou seja, posições de chefia da administração pública que são escolhidas pelos chefes de governo.
No Executivo Federal há hoje 35 mil posições em comissão, entre cargos e funções de livre provimento e alguns privativos de servidores efetivos.
A proposta foi apresentada ao Grupo de Trabalho da Reforma Administrativa da Câmara de Deputados, que é liderado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ).
A ideia do Movimento é que o Estado recrute pessoas com capacidade para gerenciar equipes, e o político escolha seus nomes para cargos comissionados apenas dentro dessa lista.
Esse "pool" de pessoas pré-aprovadas seria comprovadamente capaz de assumir cargos de chefia e, além disso, o sistema de pré-seleção teria um rol de candidatos diversos e representativo da população.
A proposta não detalha como seria a seleção das pessoas para essa lista. A ideia seria criar um sistema nacional, que teria uma política nacional de lideranças, um conselho e um portal, para deixar as escolhas transparentes.
Haveria um período de transição para as posições de livre nomeação do Executivo Federal durante quatro anos, até que todas as nomeações começassem a ser feitas a partir da lista.
O objetivo é que estados e municípios passem também a compor o sistema de lideranças.
Jessika Moreira, diretora executiva do Movimento Pessoas à Frente, afirma que a proposta "reconhece a importância de aspectos políticos nas nomeações de livre escolha das lideranças na administração pública" e defende que os aspectos técnicos e gerenciais não devem ser negligenciados.
"A escolha final continua sendo política, mas o Movimento argumenta que isso não deve impedir a consideração de outros aspectos fundamentais para enfrentar os desafios do setor público."
Folha Mercado
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Ela salienta que essa seria uma forma de garantir um quadro de chefes mais diversos: "Uma burocracia (no sentido de grupo de funcionários públicos) mais representativa gera mais resultados. A gestão pública se torna, assim, mais responsiva e conquista maior legitimidade, pois a população se sente representada".
Cibele Franzese, que além de ser conselheira do Movimento é professora e coordenadora da FGV, afirma que a experiência internacional tem caminhado para uma organização como essa.
Ela diz que mais de 75% dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) organizaram a escolha de comissionados dessa forma.
Na América do Sul, Peru e Chile adotaram uma política semelhante e, segundo ela, melhoraram índices de qualidade do serviço público. Ela cita melhora de aprendizagem de crianças chilenas e mais eficiência em ocupação de leitos e uso de materiais nos hospitais do país.
A professora também afirma que dar mais transparência ao processo de contratação de chefes no serviço público seria uma forma de atrair pessoas mais qualificadas. "Quem acha que a escolha é totalmente irracional vai começar a se aproximar, porque as regras vão estar dadas, vai haver transparência."
Nayara Albrecht, professora da Unila (Universidade Federal da Integração Latino-Americana) afirma que as escolhas para os cargos de DAS (Direção e Assessoramento Superior) variam muito "porque cada secretaria e cada órgão faz do jeito que quer" e que raramente há algum protocolo na forma como as vagas são preenchidas.
Para os cargos mais altos, ela diz, há alguma influência da filiação partidária.
"Seria produtivo padronizar as seleções nos órgãos, mas isso é desafiador, porque há uma tradição de encontrarem uma maneira de sair pela tangente."
Regina Pacheco, também da FGV, afirma que uma mudança na forma como os chefes do setor público são escolhidos é urgente: "Não tem como o país melhorar sem que o Estado tenha um bom desempenho na entrega de serviços públicos. Temos que olhar o que os outros países estão fazendo, e estamos atrasadíssimos: o Chile fez isso em 2003".
No entanto, ela diz ter algumas discordâncias com a proposta do Movimento Pessoas à Frente. Para Pacheco, a ideia de ter um sistema nacional para esses cargos não leva em conta as especificidades de cada local. "Um dirigente de escola em São Paulo é muito diferente da Bahia ou do Amazonas", por exemplo.
Pacheco critica também a criação de um conselho. Segundo ela, a escolha de dirigentes da máquina pública deve ser feita por gente especializada.
Por fim, ela diz discordar da reserva de vagas, algo que, para ela, deveria ser decidido por cada unidade.