Partido de extrema direita quer nos fechar, diz diretor de memorial de campo de concentração

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Três homens caminham pelo antigo campo de concentração de Buchenwald, oito quilômetros ao norte da cidade de Weimar, na Alemanha. É um dia quente da primavera, e eles vestem bermudas e camisetas. Ao notá-los, o diretor do memorial, Jens-Christian Wagner, avisa ao grupo de jornalistas em visita: "Eles têm tatuagens nazistas".

O trio já estava de saída. "Não posso fazer nada legalmente", lamenta. "Mas, se ainda estivessem circulando pelo campo, chamaria a segurança." Ele explica que as tatuagens dos visitantes não eram símbolos nazistas evidentes e proibidos, como suásticas, o que dificulta o controle por parte de autoridades.

Monstagem mostra campo de concentração de Buchenwald nos anos 1940 e o memorial em 2025

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Local que abrigou cerca de 278 mil prisioneiros durante o Holocausto sofre hoje com ameaças de morte aos funcionários e atos de apologia ao nazismo - Stadtarchiv Reutlingen e Folhapress

Casos assim se tornaram cada vez mais frequentes em Buchenwald. No ano passado, três jovens foram detidos por autoridades ao desenharem suásticas no memorial. Outro caso foi registrado há poucas semanas. Ao entrar, homens começaram a falar: "Quem nós vamos gasear hoje?" —ironia em relação às pessoas que morreram em câmaras de gás em campos. A polícia foi acionada, e o grupo, proibido de frequentar o memorial.

Em Buchenwald, não foram instaladas câmaras de gás durante o Holocausto, o que não significa que ali não ocorreram tragédias e mortes. No local, passaram 278 mil prisioneiros de 1937 a 1945 —a grande maioria eram homens (89%), e ao menos 56 mil morreram no campo até 1945. Depois, soviéticos prenderam líderes locais do partido nazista e empresários; calcula-se que, até 1950, outras 7 mil pessoas morreram.

O memorial tem como objetivo manter a memória das tragédias do nazismo. Para o diretor, não basta apenas uma ida ao local para que as pessoas compreendam os perigos do extremismo político. Por isso, aposta em visitas pedagógicas. "Uma visita não é uma vacina democrática. Isso não funciona."

Além de desafios educativos, o memorial enfrenta uma escalada de episódios de apologia ao nazismo e ameaças contra a equipe que trabalha ali.

O ambiente de tensão acontece diante do aumento de ataques violentos na Alemanha e de crimes com motivação política, que tiveram salto de 40% no último ano. Segundo dados divulgados pelo governo federal, metade das ocorrências (42.788) foi atribuída à extrema direita.

No país, também foi identificado um aumento de 77% de casos de antissemitismo em 2024, em comparação com o ano anterior, segundo os dados divulgados pela Rias (Associação Nacional de Centros de Pesquisa e Informação sobre Antissemitismo), divulgado no início de junho.

O diretor também acredita que o clima hostil é impulsionado pela ascensão da extrema direita, liderada pelo partido AfD, e analisa que o memorial tem o importante papel de mostrar o que pode acontecer ao desrespeitarmos os direitos humanos.

Com integrantes investigados por discurso de ódio e vínculos com grupos neonazistas, o partido coleciona declarações que relativizam o passado nazista do país.

Em 2017, por exemplo, o líder da AfD no estado da Turíngia, Björn Höcke, afirmou que os alemães são "os únicos do mundo a ter plantado um monumento da vergonha no coração de sua capital", em referência ao Memorial do Holocausto de Berlim. No ano seguinte, o então presidente da legenda, Alexander Gauland, afirmou que o regime de Hitler foi apenas "um cocô de pássaro" na longa história alemã.

"É por isso que é preciso preservar esse lugar e essa é a razão pela qual a AfD quer nos fechar." A sigla foi banida de cerimônias no memorial, localizado na Turíngia. O estado, que fazia parte da antiga RDA (República Democrática Alemã), a Alemanha comunista, reuniu mais de um terço dos votos na extrema direita nas eleições de fevereiro.

Montagem mostra contagem de prisioneiros em Buchenwald e memorial hoje, na Turíngia, na Alemanha

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- Gedenkstätte Buchenwald e Folhapress

Neste ano, a AfD tornou-se a segunda maior força no Parlamento. "Os visitantes não estão imunes ao clima político atual. Registramos cada vez mais provocações", diz o diretor de Buchenwald, Wagner. Ele calcula que, há dez anos, começou uma escalada dos ataques. A situação, acrescentou, tem piorado e ficado cada vez mais frequente.

"O número de casos mais do que dobrou. Quase todos os dias algo acontece", diz ele, que relata que são feitos na maioria por homens de 18 a 20 anos. Entre os atos em alta, estão saudações nazistas, gritos de "Heil Hitler" e pichações de suásticas.

Wagner nota ainda que, cada vez mais, visitantes rebatem questões históricas. Assim, não basta os funcionários saberem a história para contá-la. "Nossos guias precisam saber quais são esses mitos negacionistas para que possam discutir com essas pessoas", diz.

Na véspera da visita da Folha, placas do memorial foram roubadas. A polícia investiga o caso, mas o diretor suspeita de grupos neonazistas que teriam levado os objetos como troféus.

Apesar da rotina de ataques, Wagner afirma não temer o trabalho. Mesmo que, nas eleições estaduais de 2024, tenha recebido ameaças de morte por carta.

"Eu sempre denuncio essas coisas à polícia, mas até agora nada foi encontrado", diz o diretor, que teve a placa de seu carro adulterada. Esse tipo de ataque, segundo investigadores, seria uma espécie de mensagem para comunicar: "Sabemos qual é o seu carro e onde você mora".

Outro funcionário do memorial, responsável pela área educacional, também foi intimidado. Em um ano e meio, ele teve os pneus do carro furados três vezes.

Diante deste cenário, o diretor relata a necessidade de reforçar a segurança e deseja instalar câmeras de monitoramento nas entradas do campo.

Na entrada do memorial, a frase "Jedem das Seine" ("A cada um o que é seu") está cunhada no portão. Usada de forma cínica, o recado era de que os presos estavam ali por merecimento.

Em um dos prédios, há um crematório e a praça da chamada, na qual os prisioneiros eram obrigados a se apresentar para contagem todos os dias. Também há uma área em que eram preparados os corpos dos mortos antes de serem carbonizados, e as celas para os que eram considerados desobedientes.

Há, ainda, uma área em que foi instalado um zoológico, no qual os soldados levavam as famílias para passar os finais de semana. "Eles vinham aqui para aproveitar os domingos, enquanto a cem metros tem um crematório", diz o diretor.

Atualmente, fotos espalhadas pelo campo mostram um grupo de alemães, após o fim do Holocausto, vendo corpos de pessoas que morreram ali. "Os alemães se sentiram vítimas dos aliados, pois foram forçados a ver os horrores dos campos. Se sentiam como vítimas, não atores", diz o diretor.

No local, diversos estudantes se amontoam em visitas guiadas, que têm até três anos de lista de espera. O diretor se preocupa com discussões que surgem, em meio ao aumento de ataques neonazistas por parte de jovens, sobre a obrigação de idas aos campos de concentração com escolas.

Para ele, uma ida ao memorial não pode ser feita de forma rápida e protocolar. Por isso, Wagner acredita em uma abordagem profunda. "Não queremos confrontar os visitantes com horror. Ao contrário, queremos que eles aprendam a história."

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