O STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria a favor de ampliar a responsabilização das plataformas digitais por conteúdos de usuários.
Oito ministros se posicionaram nesse sentido, e apenas três defenderam a manutenção das regras atuais.
A legislação em debate é o Marco Civil da Internet, de 2014. Ele estabelece, em seu artigo 19, que as empresas só podem ser punidas por eventuais danos decorrentes de conteúdo caso ele não seja removido após ordem judicial.
Há apenas duas exceções —nudez não consentida, que está no artigo 21 do Marco Civil, e violação de propriedade intelectual. Nesses casos, basta uma notificação extrajudicial, como uma denúncia de usuário.
Os oito ministros que se posicionaram pela mudança das regras defendem que o artigo 19 é parcial ou totalmente inconstitucional. Já os de posição minoritária argumentam que o dispositivo é constitucional.
Conheça o voto dos ministros sobre o tema.
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Favoráveis a mudanças na interpretação atual:
ALEXANDRE DE MORAES
Propôs uma categoria de conteúdos que geraria responsabilidade imediata das plataformas, mesmo que elas não tenham sido notificadas. Com isso, elas teriam que monitorar ativamente conteúdos como discurso de ódio, atentado contra a democracia, racismo, nazismo e fascismo, além de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral.
CÁRMEN LÚCIA
Defendeu a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 19. Ela disse entender que os ministros precisam definir os casos em que a responsabilidade das empresas deve ser maior e negou que sua posição esteja ligada a restrições à liberdade de expressão.
DIAS TOFFOLI
Relator de um dos casos em julgamento, defendeu um regime de responsabilidade objetiva para empresas de internet, incluindo desde redes sociais até Mercado Livre, Wikipedia e Amazon. Seguindo a tese de Toffoli, qualquer um pode processar essas empresas caso encontre, em suas redes, um conteúdo da lista de vedados, entre eles crimes contra o Estado democrático de Direito, atos de terrorismo ou preparatórios, induzimento a suicídio ou à automutilação, racismo, violência contra a criança e mulher, oposição a medidas sanitárias, divulgação de fatos notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que levem à incitação à violência física.
CRISTIANO ZANIN
Defendeu que empresas possam ser responsabilizadas independentemente de decisão judicial no caso de conteúdos manifestamente criminosos. Abriu exceção para possíveis crimes e situações de "zona cinzenta", em que não esteja clara a ilicitude do material.
FLÁVIO DINO
Defendeu que uma notificação extrajudicial seja suficiente para tornar as empresas potencialmente responsáveis por conteúdo de terceiros, com exceção de crimes contra honra. Para esses casos, ainda seria preciso ter ordem judicial. Defendeu ainda que as plataformas não sejam punidas por uma única postagem, mas pela análise da conduta geral em relação a conteúdos considerados ilícitos.
GILMAR MENDES
Propôs que seja mantida a necessidade de decisão judicial para responsabilizar as empresas no caso de crimes contra a honra e conteúdos jornalísticos, mas estabeleceu como regime geral a responsabilidade após notificação. Afirmou que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados poderia atuar como órgão regulador.
FolhaJus
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LUÍS ROBERTO BARROSO
Defendeu que, em casos de ofensas e crimes contra a honra, a necessidade de decisão judicial prévia deve continuar valendo. Mas, para os demais conteúdos considerados ilícitos, a plataforma já estaria sujeita a responsabilização a partir de uma notificação extrajudicial. Já no caso de anúncios ou postagens impulsionadas mediante pagamento, a responsabilização ocorreria independentemente de notificação.
LUIZ FUX
Defendeu que as redes devem ter obrigação de monitoramento ativo sobre conteúdos evidentemente ilícitos e possam ser responsabilizadas nos casos em que tenham "ciência inequívoca" do material ou em que o mesmo tenha sido impulsionado. Disse considerar "evidentemente ilícito" "discurso de ódio, crime, racismo, mais explicitamente pedofilia, incitação à violência, apologia da abolição violenta do Estado democrático de Direito e apologia a golpe de Estado".
Contra mudanças na interpretação atual
ANDRÉ MENDONÇA
Defende a constitucionalidade do artigo 19 e foi além, sugerindo tornar inconstitucional remover ou bloquear perfis de usuários em redes sociais, a não ser quando forem comprovadamente falsos —ou seja, quando se tratar de uma pessoa se passando por outra ou um perfil robô ou inautêntico.
EDSON FACHIN
Defendeu a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil. Afirmou ser necessário dar maior proteção aos direitos fundamentais envolvidos no debate, mas disse que isso não deveria ser feito via Judiciário. "É péssima a experiência que este país teve na regulação dos meios de comunicação. Corremos o risco de ver temerárias ações contra jornalistas e professoras."
KASSIO NUNES MARQUES
Manifestou-se pela manutenção da atual regra para a responsabilização por conteúdos de terceiros, sob o argumento de defender a liberdade de expressão, e defendeu que o Congresso se debruce sobre o tema.