Linha de montagem constrói maior túnel imerso do mundo na Europa; veja infográfico

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Santos e Guarujá se preparam para uma ligação que deve mudar a dinâmica do litoral paulista. No dia 5 de setembro, um leilão dará início formal ao projeto que deve conectar as duas cidades por um túnel imerso de 870 metros, após décadas de promessas políticas.

Um irmão maior do projeto brasileiro é construído neste momento entre Dinamarca e Alemanha, com 18 quilômetros, extensão recorde para a técnica, segundo o consórcio que lidera a sua construção.

Túnel imerso não é escavado, mas montado em peças no leito do oceano. O argumento para opção construtiva, nos dois casos, é a velocidade e um menor impacto ambiental. A despeito da descrição, encaixar milhares de toneladas de concreto armado dentro do mar leva anos e requer precisão de milímetros. E custa caro.

Os governos do presidente Lula (PT) e do governador de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos), parceiros na empreitada caiçara, estimam o custo do Santos-Guarujá em R$ 6,84 bilhões; já o Fehmarnbelt teve € 7,4 bilhões (R$ 42,1 bilhões) de orçamento aprovado em 2015.

A conta por quilômetro não é favorável para os brasileiros (R$ 7,8 bilhões contra R$ 2,34 bilhões), ainda que seja impróprio comparar as cifras e as obras.

A estrutura nórdica, que levou mais de 15 anos para sair do papel, contou com financiamento de € 1,3 bilhão (R$ 5,9 bilhões) da União Europeia e faz parte de um corredor de integração do continente que vai da Finlândia a Malta.

O restante dos recursos saíram de empréstimos, a serem quitados pelos usuários. O prazo de reembolso via pedágio é de 28 anos, e a operação é tocada por uma estatal dinamarquesa, Sund & Baelt, que administra várias ligações importantes de um país formado por uma península e mais de 400 ilhas, como a ponte-túnel Oresund.

O complexo, inaugurado em 2000, liga Copenhague a Malmo, na Suécia, com uma ponte de oito quilômetros e um túnel de quatro quilômetros, primeiro imerso da história, segundo os locais. O conjunto extravagante foi adotado porque o lado dinamarquês não comportaria a extensão da ponte devido à proximidade do aeroporto da capital. A solução foi juntar as duas estruturas com uma não menos peculiar ilha artificial.

A técnica desenvolvida para o Oresund é repetida agora entre Lolland, a quarta maior ilha dinamarquesa, e Fehmarn, também uma ilha, ao norte da Alemanha. O nome do túnel não é uma concessão aos alemães, mas uma referência ao estreito, também chamado de Fehmarn ou Femern, em dinamarquês.

Atualmente, uma via expressa e uma linha de trem na região são interrompidas pelo Báltico. Carros e composições atravessam os 18 quilômetros de mar em uma balsa, que faz a travessia em 45 minutos, sem contar as operações de embarque e desembarque.

Com o túnel, previsto para entrar em operação em 2029, um ano depois do de Santos, a viagem de carro vai levar dez minutos, e a de trem, sete minutos. Talvez o resultado de maior apelo da ligação, a viagem de Hamburgo para Copenhague será feita em duas horas e meia, metade do tempo atual.

As obras começaram em 2020 do lado dinamarquês, em Robdyhavn, com a construção de uma fábrica de elementos que consome boa parte do campo de obras de 600 hectares, o maior da Europa neste momento. Elementos são as peças que formarão o túnel, moldadas, cada uma, com nove segmentos de concreto armado em um galpão climatizado. A cura do concreto exige condições particulares para que a peça produzida tenha solidez e longevidade —o prazo de validade do túnel é de 120 anos.

Folha Mercado

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A questão é o tamanho de cada elemento: 217 metros de comprimento, 42 metros de largura e 15 metros de altura. Seu interior oco comporta duas pistas duplas para veículos, duas linhas de trem e um túnel de serviço. Estão sendo construídos 89 desses elementos, dez deles com um piso inferior para serem instalados a cada dois quilômetros. Servirão no futuro como pontos de operação e manutenção do túnel.

Para dar conta da tarefa existem seis linhas de produção na fábrica, trabalhando 24 horas por dia, sete dias por semana. O ritmo é intenso, pois cada elemento consome nove semanas para ficar pronto. O primeiro foi moldado em 2023 e irá ao mar ainda neste ano boiando, apesar das 73 mil toneladas de peso, o equivalente a 14 mil elefantes, na pouca esclarecedora comparação feita pelos construtores.

As extremidades do elemento serão seladas, conferindo-lhe flutuabilidade; como a peça é excêntrica e a parte de carros pesa mais, tanques de lastro serão instalados na parte dos trens para dar estabilidade ao conjunto. A transferência para o mar ocorrerá através de um dique seco. Rebocadores então levarão a peça até o ponto em que ela deve ser afundada com a ajuda de lastros de concreto. Duas embarcações especiais controlarão a imersão até que a enorme caixa de concreto pouse no leito do mar, já preparado para a recepção.

De 2021 a 2024, uma dragagem retirou 15 milhões de metros cúbicos de sedimentos e abriu uma avenida no fundo do estreito; nela, os elementos serão depositados um a um a partir de portais nas margens, que também já foram finalizados. Um elemento se encaixará no outro através de uma guia e grandes presilhas. A água entre as extremidades será então escoada, criando uma pressão negativa e garantindo a estanqueidade enquanto a união das peças é definitivamente selada.

A operação terá uma precisão de 15 mm, segundo os construtores, uma evolução em relação ao Oresund, que contou com 50 mm para encaixar elementos bem menores, de 40 metros de comprimento.

A lateral da peça instalada será então aberta para o túnel em formação, que ganha assim mais 217 metros. O novo trecho passa a receber imediatamente os equipamentos viários e ferroviários necessários para o futuro funcionamento do Fehmarnbelt, assim como itens de segurança, comunicação, iluminação e ventilação. Um último elemento especial deve unir os dois lados da construção em 2028.

Durante sua execução, o túnel ganhará uma cobertura de pedras e cascalho, fazendo sumir a trincheira criada pela dragagem. As marés do Báltico tratarão de devolver sedimentos e o aspecto natural ao fundo do estreito.

Descrita como uma obra concebida como "blocos de Lego" pelo jornal The Guardian no ano passado, o Fehmarnbelt acabou inspirando a marca dinamarquesa neste verão europeu.

Uma versão do canteiro de obras e do túnel em construção foi erguida com 800 mil peças do brinquedo no parque Legoland, em Billund, cidade que abriga a sede da empresa. Uma empreitada bem mais curta que a do túnel real, mas impressionante de qualquer forma: 4.000 horas de trabalho.

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