Membros do governo veem influência de cartões e big techs na pressão dos EUA sobre o Pix

12 horas atrás 3

Membros do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aliados enxergam lobby de empresas de bandeiras de cartão de crédito e de big techs por trás da pressão dos Estados Unidos sobre o Pix brasileiro.

Na investigação comercial aberta pelo governo Donald Trump contra o Brasil, o Pix virou alvo como uma possível prática desleal do país em relação a serviços de pagamentos eletrônicos.

Amanda Athayde, consultora do Pinheiro Neto Advogados, diz não haver fundamento jurídico por trás do questionamento dos EUA.

"O Pix é uma política pública que melhorou a concorrência em um mercado que passou a ser um dos mais competitivos e dinâmicos do mundo", diz Amanda.

A estratégia do governo será defender o Pix, de acordo com auxiliares de Lula ouvidos pela reportagem da Folha. Um deles disse que a população virá junto com o governo no apoio ao sistema, dada a sua popularidade.

A rapidez com que o Pix foi adotado pelos brasileiros impactou o negócio de plásticos, como são chamados os cartões no mercado bancário, como a Visa e a Mastercard.

"O Pix passou a ser alvo dos Estados Unidos porque altera significativamente a dinâmica do setor financeiro, que é dominado globalmente por empresas privadas norte-americanas, como Visa, Mastercard e PayPal.", diz Daniel Blanck, sócio-proprietário da BB Law.

De acordo com o especialista em direito bancário, sistemas de pagamento são considerados infraestrutura crítica, pois, se mais países adotarem soluções nacionais, os Estados Unidos perdem influência sobre mecanismos de transação financeira, que hoje são ligados ao dólar.

O governo Lula busca se tornar menos dependente do dólar em transações internacionais, desenvolvendo mecanismos de transferências sem a moeda dos EUA com a China. Além disso, o BC abriu o código fonte do Pix para demais bancos centrais. A Colômbia é um dos países que aderiu aos pagamentos instantâneos com base na experiencia brasileira.

Peru, Chile e México também estudam a adoção. Além disso, China e Índica já possuem sistemas semelhantes operados por entes privados.

"O Pix é um sistema eficiente, barato e seguro, sem depender de empresas americanas.Outros países podem adotar o mesmo modelo e isso coloca em risco o soft power dos EUA sobre a economia global", diz Thays Murta, sócia do César Fiuza Advogados.

Dados do Banco Central mostram que a participação dos cartões perdeu ímpeto após a implantação do Pix, especialmente na modalidade débito, substituída pelos pagamentos instantâneos. Outra ameaça ao setor é o Pix parcelado, uma espécie de empréstimo pessoal com juros menores, que permite o cliente pagar à vista no Pix, mas arcar com o custo em parcelas mensais junto ao banco.

Para o governo, há também uma intenção em discutir a privatização do Pix por trás da pressão liderada pelo governo de Donald Trump.

A movimentação acontece no Brasil e no exterior e já houve até ameaças de processar o Brasil pela Pix pela concorrência que o sistema gerou. A briga não é de hoje e se intensificou também com as big techs.

Antes do lançamento do Pix, o Banco Central segurou o lançamento do WhatsApp Pay, uma funcionalidade do aplicativo de conversas que permita enviar e receber dinheiro entre usuários diretamente pelo app, inicialmente operado pela empresa de maquininhas Cielo.

Na época, havia a preocupação, por parte do regulador, de que WhatsApp Pay esvaziasse o Pix. Isso, junto com a dificuldade em lidar com um player de tecnologia dominante, fez com que o BC demorasse para autorizar o WhatsApp Pay. E quando a autorização veio, o Pix já havia tido enorme sucesso, o que enfureceu a Meta, dona de várias plataformas como Facebook, Instagram e WhatsApp, que havia investido pesado na sua funcionalidade de pagamento instantâneo.

Folha Mercado

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Participantes do mercado bancário avaliam que há uma preocupação das bandeiras com um arranjo de pagamentos do Pix, que faz hoje que o instituidor, no caso o Banco Central, também as autoriza e regula. A preocupação, diz um desses players, é que o chapéu duplo acabe fazendo com que se beneficie o Pix em detrimento desses arranjos.

O incômodo aumentou agenda agressiva de produtos e funcionalidades associados ao Pix implementada pelo BC brasileiro a partir da gestão do ex-presidente da instituição Roberto Campos Neto.

Um dos problemas é que, embora ainda haja um espaço grande para o crédito com as empresas de bandeiras, o Pix também está avançando cada cada vez mais para ocupar esse espaço, com o uso do Pix em garantia e o Pix parcelado. O temor é que novas funcionalidades do Pix substituam os cartões.

Procuradas, as bandeiras de cartões se manifestaram via Abecs (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços).

"A Abecs tomou conhecimento e está avaliando e acompanhando, juntamente aos seus associados, os desdobramentos do tema com atenção dentro de sua esfera de atuação", diz em nota.

Procurados, Meta e Banco Central disseram que não vão comentar.

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